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Imagem por Lais Pinheiro |
- Há quanto tempo ela está assim? – A voz
invade o quarto e ecoa, mesmo que baixa. A resposta vem em um tom triste, quase
inerte. – Dois anos, semana que vem completa três. – O vazio da sala era
latente, as duas presenças conhecidas não incomodavam a garota de forma alguma.
Havia a falta de brilho no olhar e a mente fechada em si. Os dois outros seres,
que não se encontravam dentro da alma perdida da garota, recolheram-se para o
outro cômodo, conversando sobre qualquer coisa desinteressante. Não havia o
presente, somente o passado desgostoso de lembranças perdidas na boneca de
porcelana.
“Quero um cigarro”. A mente trabalhava pura e
leve, como se já tivesse tragado o cigarro que pedia em silêncio. Enchia-se de
fogo e ardência dos anos que se foram e não voltam, os anos que seus desejos e
pensamentos foram mais envelhecidos que ela própria. Encarava o espelho sem
conclusões, sem jeito pra coisa. Mordia-se. Gritava-se muda. “Quero um cigarro”.
E juntava-se no encarar daquela imagem clara, quieta, sóbria. Uma criança...
Que deixara de ser criança há tempos. Fugira certa vez do estado triste que inventara
para si... Lera três livros e voltara a ser essa desconhecida de si mesma.
O mundo é injusto com boas almas; e quem se
perde na infância, perde-se para sempre. Ela concluiu sozinha aos quatorze.
Juntara os trapos de horizontal para, enfim, tornar-se um subir eterno de quem
nunca o fora. Loucura mesmo era despentear-se em meio a um vulcão imaginário,
por isso segurava a escova a todo momento, mesmo que a criatividade não
captasse tal inconsciência. – Quer um chá, meu amor? – Perguntara a mãe, que aparecera
na porta novamente. O silêncio voltou a perpetuar-se no quarto e na mente.
Pergunta ignorada, a mãe saiu, não achando que poderia ser diferente. Não era
amor de ninguém, não queria ser.
O caminhar eterno de pés descalços em meio a
fogo e pássaros carniceiros era ilusória, mas tão real... E, mesmo criança de
dezessete, queria o cigarro de quem tem cinquenta. Jogava-se em pequenas
brincadeiras cruéis consigo mesma, de quem mais fora o violeta viscoso. Apenas
ela. O sorriso pôs-se cru, pensou que talvez não lembrasse de algum abuso que
sofrera... Forçou a mente. Ainda não lembrava. Ela era assim por ser assim.
Ninguém a fizera, ela se fez. Descaminhou-se novamente entre o fogo, voltou a encarar
o espelho. Era toda violeta viscosa.
você é LINDA
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