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domingo, 19 de setembro de 2010

Olhar do desespero


Estava eu e as amigas, divertindo-nos mais do que parecia possível, em um barzinho de uma esquina qualquer. Entre gargalhadas e lembranças meus olhos se esquivaram para o restaurante ao lado, onde pude observar uma família um tanto quanto atípica. Antes de todos, eu o vi; alto e magro, traços bonitos, óculos de grau. Sentava-se à frente de uma jovem pequena e chorosa, completamente desesperada. Ao lado dela, uma senhora bonita, mas deprimida o suficiente para marcar-se em minhas lembranças mais melancólicas. Para completar o quadro um senhor de rosto memorável, no qual se percebia a indiferença para com o momento.

Encarar a cena chegava a ser constrangedor, mas prendia minha atenção de forma a não me deixar desviar o olhar. Comiam quase que em silêncio ferino, com exceção da jovem que continuava a chorar sem interrupções. Dava-me náuseas. Na verdade deixava-me saudosa de um dia específico de um ano sem outras recordações, no qual mamãe chorou em um enterro de gente desconhecida por mim. A mulher mais velha fitava o senhor com os olhos penosos, enquanto este dava mais atenção ao garfo cheio de comida.

E havia ele. Observando apenas a ele, não existia mais ninguém naquela mesa, naquele restaurante. Exalava demência, ódio e discórdia. Foi o momento mais gélido de minha vida aquele em que nossos olhos se encontraram. Por trás das lentes, puro desprezo, por trás da íris, morte. Creio que era isso... Nada mais que morte e brutalidade. Talvez o medo do rapaz passasse isso a mim, aos meus nervos. Apertava a faca de serra com toda a força que tinha, saltando-lhe as veias. Por um breve instante eu acreditei que ele fosse atacá-la.

Então chamaram-me, cutucando meu ombro. Sorri transtornada para a mais bonita de nós e levantei. Senti uma lágrima descendo minha bochecha que provavelmente estava pálida – como fora confirmado por uma outra amiga -, e fui até a mesa dos desconhecidos mais familiares que eu poderia encontrar. Coloquei minha mão no ombro dele, apertando-o, e depois fomos todas para casa. Boa sorte fora meu tom naquele toque, esperava seu controle mais que qualquer um daquela mesa. 

sábado, 18 de setembro de 2010

Olho por olho, dente por dente


Via-se de longe o casal, chamava muito a atenção. Ela não tinha mais que um e sessenta, ele não tinha menos que um e oitenta. Duas pessoas incrivelmente estranhas, atípicas. O fato de ela ter um ponto de interrogação tatuado na batata da perna direita não era nada comparado ao de ele usar um kilt de brim preto. Ela abraçava sua cintura como se abraçasse o mundo, ele tinha o braço sobre seu ombro de forma a deixar claro para todos que ela era toda sua.

Eles não tinham época, não se encontravam em década alguma. Pareciam, na verdade, alheios a qualquer medida de tempo, como se o mesmo não existisse. Nenhum dos dois levava um relógio no pulso, era dispensável. Não havia sorrisos, a exceção de quando seus olhares se encontravam. As pessoas pareciam evitá-lo, eles retribuíam o gesto. Só queriam ficar juntos e sozinhos, como se nunca tivessem feito isso.

Passando por um banco ele sentou-se, puxando-a para si. Beijou-a com tanta intensidade que parecia sugar sua alma. Não que fosse necessário, sua alma já era dele. Ela entregava-se por inteiro, agarrando seu pescoço e retribuindo tudo o que lhe era proporcionado. A relação deles parecia ser assim; olho por olho, dente por dente. Ela tinha medo do fim daqueles dias, que parecia cada vez mais próximo, e ele sabia disso.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Uma frase...

Inove e esqueça que já se banalizou a vida.

Como antes, como sempre.


- Olha isto. - Estavam sentados embaixo de uma árvore grande, de tronco largo, folhas de um verde ensurdecedor. Sim, ensurdecedor. Era como ela via, um verde que de tão vibrante gritava-lhe a vivacidade de um dia único. Nas mãos dele, uma joaninha, caminhando para o outro lado, atravessando aquele mundo de epiderme. 

- Uma joaninha, que tem de mais? - A frieza da voz da jovem era tamanha, espantou-o. Balançou a mão até o inseto cair, levando consigo seu ânimo. Um cão corria pelo parque municipal, a cena era perfeita. Parecia um quadro, ou uma fotografia... Ela adorava fotografias. Trabalhava com isso, ele sabia, tinha quatro câmeras: uma polaroid, uma profissional, uma de filme e uma digital. - Que sorriso é esse? - A pergunta saiu bruta, como uma faca de serra para cortar a lasanha. 

- Estava lembrando... - O dia em que entrou na sala escura dela e ligou a luz. Nunca a tinha visto tão furiosa. Tão bela, esbravejando, chorando e chutando suas canelas. Ele também começara a sorrir, encarando-a estupefado. - Com raiva você fica mais bonita. - Aproximara-se e dera um beijo em seus lábios, e logo ela também sorria, mais debochada e irônica do que de fato feliz. Não que ela não estivesse, ela estava. 

No momento havia uma ponta de dor entre os dois, como a visão de um iceberg ao longe que ainda não fora descoberto. Ela deitou sua cabeça no ombro do jovem, encarando a árvore de folhas gritantes, desviando do iceberg. - Eu te amo, sabe? - A frase, pela primeira vez, soara sincera. 

- Sei. - Tanto quanto ele a amava, mas não o disse. Levantou-se e saiu, deixando-a sozinha com aquela foto que ela tirara em um dia qualquer.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Cinismo a dois.

Eu e ele,
Nossas mentes,
Nossos corpos.

Dores quentes.
Dois doentes.

O pensamento ávido
A jóia do desapego
Literatura implícita, a arte do sossego.