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domingo, 24 de março de 2013

Paraquedas




Hoje eu acendi um cigarro e vigiei a fumaça (sumir). Lembrei-me de todos e quaisquer pormenores que o senhor deixava de me contar... Era sempre um “deixa pra lá”, “nada não”. E como me arrependo de não ter insistido! Talvez eu pudesse ouvir o segredo de uma vida inteira, se tivesse paciência para dizer “conta logo”. Ah, se eu tivesse paciência! Para tudo no senhor, digo. Eu poderia ter te aguentado mais do que aguentei. Mas o senhor sabe como é difícil de te aguentar, não sabe? Bom, se antes havia dúvidas, não há mais. O senhor é chato.

Mas hoje eu acendi um cigarro e não tenho mais tanta raiva das coisas que o senhor dizia. É, porque não diz mais, apesar de ainda ser o senhor. Agora fala pouco, cruza os braços e balança a cabeça, seja pelo sim ou pelo não. Normalmente é pelo não. O senhor sempre me diz um não. Por quê?

paraquedas
hoje não
abriu

Aí me deixei voar com a fumaça e sumi com ela. É que o senhor sempre dizia “que sorte seria se o paraquedas não abrisse”. Hoje que o senhor disse não – mais uma vez, por quê? –, doeu-me voar sem o senhor. Mas não foi minha culpa! Eu te chamei, não chamei? Mas, mais uma vez, o senhor disse não. Por que diz não? Aquela cabeça branca balançando negativamente... Não, não, não. “Deixa pra lá.”. Eu deixei pra lá e o senhor perdeu o paraquedas que não abriu.

caí sem
o
senhor

Que ficou sentado, fumando o seu cigarro. E o meu, que hoje acendi, já está no final. Estou sumindo com a fumaça e o senhor traga devagar todo o resto do seu, uns vinte anos atrás. Eu já não moro mais perto do senhor, e a fumaça preta agora está em mim. Lembra quando o senhor parou? Teimoso, demorou. Sua fumaça preta é minha agora. E o paraquedas, que não se abriu para mim, abre-se para o senhor, que continua flutuando até pousar no chão.

eu sumo
com a
fumaça

Eu subo sem nem mais ouvir falar do meu avô.

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