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terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Mentirosa




De tanto fingir, passei a acreditar. Agora não sou eu mesma, minha atuação incrustou-se em minha personalidade e minha risada dirige-se aos idiotas que me cercam. Esse sorriso mentiroso que ocupa minha face estúpida tira-me qualquer esperança e a dor inventada acabou por sempre tomar meu corpo ignóbil. No fim, eu sou a puta que fecha o cortiço de madrugada e abre o convento de manhã, com a visão de que a vida é um lixo, mas a aparência da boa vontade. O mundo é bom, o homem é justo.

Admito sentir falta de tragar um cigarro, a metáfora preta e suja queimando-me a garganta, sinto falta de meu futuro câncer pulmonar. Mas não, eu não fumo. Meu lado puramente falso recusa-se a soltar a fumaça branca pelo sorriso de satisfação, a desculpa é que falta-lhe ar. Falta-lhe ar a porra! Falta-me coração. O coração de espantar-me com o mendigo na rua, chorando, maltrapilho, a cantar uma melodia franca de tristeza. Aquele mendigo, aquele mísero, mostra-se mais verdadeiro, mais real, mais digno que eu. Ele fuma, choroso. Eu? Nem isso. O mundo é bom, o homem que não é justo.

Talvez nascer não tenha sido uma boa ideia afinal. De início sim, de início era uma ótima ideia. Temos o amor de Deus ao nascer, o amor dos pais, mas então crescemos... Eu cresci o suficiente para perguntar-me, firme, “cadê esse Deus de que tanto me falam?”. E, bem, cadê esse Deus que me deixou mentir tanto e tão bem que nem eu mesma desacredito-me? Deus é a enganação dentre de mim, então? Eu sou o engano de Deus? Eu inexisto como gente. Inexisto como ‘eu’. O mundo, então, não é tão bom.

Mas eu sorrio ainda, em parte. E, em parte, minha felicidade mentirosa torna-se prazer real. Estou viva em sujeira, mas pelo menos estou viva. A puta do convento também sorri, um tanto encabulada, um pouco entalada na própria merda, mas sorri. O mundo é bom, o homem é justo, a vida que mente.

2 comentários:

  1. Te amo puta, freira, eloquente, fumante, chorosa ou a porra toda.
    Engraçado como a dor é tão pessoal e genérica ao mesmo tempo. Sei do que você tá falando.
    E o mundo é bom.

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  2. E agora acho que a melhor parte de meu texto foi o seu comentário.
    O mundo é, de fato, bom.

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