De tanto
fingir, passei a acreditar. Agora não sou eu mesma, minha atuação incrustou-se
em minha personalidade e minha risada dirige-se aos idiotas que me cercam. Esse
sorriso mentiroso que ocupa minha face estúpida tira-me qualquer esperança e a
dor inventada acabou por sempre tomar meu corpo ignóbil. No fim, eu sou a puta
que fecha o cortiço de madrugada e abre o convento de manhã, com a visão de que
a vida é um lixo, mas a aparência da boa vontade. O mundo é bom, o homem é
justo.
Admito
sentir falta de tragar um cigarro, a metáfora preta e suja queimando-me a
garganta, sinto falta de meu futuro câncer pulmonar. Mas não, eu não fumo. Meu
lado puramente falso recusa-se a soltar a fumaça branca pelo sorriso de
satisfação, a desculpa é que falta-lhe ar. Falta-lhe ar a porra! Falta-me
coração. O coração de espantar-me com o mendigo na rua, chorando, maltrapilho,
a cantar uma melodia franca de tristeza. Aquele mendigo, aquele mísero,
mostra-se mais verdadeiro, mais real, mais digno que eu. Ele fuma, choroso. Eu?
Nem isso. O mundo é bom, o homem que não é justo.
Talvez
nascer não tenha sido uma boa ideia afinal. De início sim, de início era uma
ótima ideia. Temos o amor de Deus ao nascer, o amor dos pais, mas então crescemos...
Eu cresci o suficiente para perguntar-me, firme, “cadê esse Deus de que tanto
me falam?”. E, bem, cadê esse Deus que me deixou mentir tanto e tão bem que nem
eu mesma desacredito-me? Deus é a enganação dentre de mim, então? Eu sou o
engano de Deus? Eu inexisto como gente. Inexisto como ‘eu’. O mundo, então, não
é tão bom.
Mas eu
sorrio ainda, em parte. E, em parte, minha felicidade mentirosa torna-se prazer
real. Estou viva em sujeira, mas pelo menos estou viva. A puta do convento
também sorri, um tanto encabulada, um pouco entalada na própria merda, mas
sorri. O mundo é bom, o homem é justo, a vida que mente.
Te amo puta, freira, eloquente, fumante, chorosa ou a porra toda.
ResponderExcluirEngraçado como a dor é tão pessoal e genérica ao mesmo tempo. Sei do que você tá falando.
E o mundo é bom.
E agora acho que a melhor parte de meu texto foi o seu comentário.
ResponderExcluirO mundo é, de fato, bom.