Observação inicial: Primeiro texto meu para se ler em voz alta, não tenha vergonha, solte-se... Faz bem gritar consigo mesmo às vezes.
Seu sorriso indecente me pegou desprevenido. Como um vento repentino leva um chapéu de moça, seu sorriso indecoroso levou minha consciência. O que fazia com aquele copo de mágoas na mão esquerda? Eu sei, eu sei, estava prestes a derramá-lo sobre mim. Nunca fora terna, e não o seria naquele momento. Por que ainda estava com ela? Por que ainda a queria em minha pequena e cabível vida? Ela desconfigurava tudo, desestruturava todos os eixos antes bem colocados por mim. Os de fora chamavam o que tínhamos de amor, eu chamava de puro desespero. Um desespero tão incomodo, mas ao mesmo tempo tão intrínseco, que confundia-me. Num ato tão inesperado quanto seu sorriso indecente, bebeu as mágoas. As mágoas que deveriam ser minhas, que agora deveriam estar em minha garganta, presas. Um favor egoísta não é um favor.
Aquilo que todos chamavam de amor, aquilo que eu era obrigado a considerar amor, aquilo que ela jogava-me na cara como amor, aquilo simplesmente enojava-me. E ela continuava ali, bebendo de sua amargura e encarando-me com os olhos de ressaca da noite anterior. Aquele olhar fazia-me mal, derretia-me a alma e escandalizava-me a mente. Mas perder aquilo não era uma opção. Eu simplesmente não podia deixá-la viver para outro, porque então esse ódio e pavor que sinto dela e por ela não fariam qualquer sentido.
Cabelos negros como o ébano da janela de nosso apartamento frio, e ela joga esses cabelos para seduzir-me, sei que sim. Mas ela não me seduz, nada naquela pele macia de pecados, ou mesmo naqueles seios delicados de covardia, nada nela me seduzia. Os cachos definidos eram o símbolo do meu passado estúpido. Tudo nela... Eu simplesmente... Tudo nela enfeitava meus desejos mais mórbidos de quebrar aquele pescoço moreno e frágil. Sentou-se ao meu lado, o copo vazio era apenas mais uma metáfora para o oco que habitava nosso interior.
Seus braços desnudos eram o meu silêncio sombrio, seus lábios experimentando o ar derretido ao seu redor eram o meu suor nervoso. E esse suor quase sólido, ainda que me saísse dos poros apenas de forma conotativa, sufocava-me o âmago. E esse meu ser suado de terror e ternura ainda era minha própria ilusão de mim mesmo, a ilusão de um indivíduo tão incapaz de ser amado ou detestado, que chega a se afundar nas tristezas daqueles que não conseguiram deixar a imaturidade.
Lá estava ela, sorrindo seu sorriso indecente, indiscreto. Encarava-me como se eu fosse um pobre coitado que não merecia o que tinha, se é que tinha algo. E por um momento fui levado ao status de uma aranha indesejada, um mísero aracnídeo que merecia a morte. Eu era, e eu sou, esse inseto que é fitado por olhos tão verdes quanto o mar... Mas eu só conseguia vê-los vermelhos de sangue. Talvez os olhos que estivessem vermelhos de fato fossem os meus e esse meu ódio de querer mais e mais e mais... E mais... Esse meu ódio de querer seu oportuno ódio que não existia, que nem sequer manifestava-se, mesmo que inintencionalmente!
Querido eu. Aliás, querido não. Desprezado e emancipado de sentimentos eu, por favor não a ataque. Esses seus gestos, ou melhor, reflexos de movimentos fatais não são uma ideia nem ao menos considerável. Largue disso, desprezado e emancipado de sentimentos eu, por favor largue disso. Sorrir de volta um novo sorriso de desprezo pelo meu próprio ego era o que eu poderia fazer, e foi o que fiz. Seus lábios impuros e secos tocaram os meus e minhas faces contraíram-se numa expressão de insanidade pura, não escolhida e não querida insanidade. Esse breve momento foi interrompido e ignorado por nós. Levantando-se então para dar-me o golpe certeiro, ela me fez a pergunta final...
- Quer também?
MUITOOOOOOOO BOM, priminha linda. *Para variar*
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